É com imenso prazer que anunciamos o término de mais um ciclo de pesquisa e ação do Observatório de Remoções com o lançamento de um balanço crítico destes processos, transformado em artigos organizados na publicação “CARTOGRAFIAS da produção, transitoriedade e despossessão DOS TERRITÓRIOS POPULARES”.
Desde 2012 o Observatório das Remoções vem monitorando os processos de ameaça, remoções e despejos – inclusive no período da pandemia de Covid-19. Com isso, tem ajudado a tirar o tema da invisibilidade e mostrar para a sociedade que processos de remoção transformam a vida das pessoas afetadas e muitas vezes as mantém em situações de transitoriedade permanente.
Nestes anos de atuação, o Observatório expandiu suas análises para outras cidades e regiões do país através de seus parceiros. Segue na Região Metropolitana de São Paulo com LabCidade FAUUSP, LabJuta/UFABC e Projeto Conflitos Fundiários Urbanos do Instituto das Cidades da UNIFESP; em Belo Horizonte, com o PRAXIS-EA/UFMG; em Fortaleza, com o LEHAB/UFC; e, recentemente, expandiu-se para Rio de Janeiro, com o Labá – Direito, Espaço & Política/UFRJ.
Este trabalho é mais que um relatório bianual (ver outros relatórios bianuais aqui): foi fruto de um processo de trocas e debates semanais com os pesquisadores e parceiros de pesquisa, iniciado em meio à pandemia de Covid-19, que se transformou em uma oportunidade para o acúmulo e amadurecimento crítico em termos metodológicos, teóricos e empíricos comuns ao grupo de pesquisadores.
E por que lê-lo? Primeiro porque o balanço de quase uma década do Observatório de Remoções envolveu uma evolução na compreensão da metodologia de pesquisa como um processo emancipatório, colaborativo na coleta de dados, processos de formação e disseminação de resultados e campanhas. O livro traz um balanço de mais de uma década de observação em São Paulo e Fortaleza e apresenta métodos inéditos de mineração dos dados dos bancos de sentenças do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, revisitado de forma a trazer uma dimensão territorial das disputas. Traz também outros dois métodos mostrados em artigos distintos: o de cartografia jurídica, que enfrenta a tendência de “despacialização do direito”, e um método que construiu e conceituou o “quadro de insegurança habitacional” a partir de dados disponíveis nos censos demográficos para São Paulo.
A publicação procura também iluminar dimensões do processo de remoção encobertas por análises que não refletem sobre quem vive a experiência de perder a casa. Para isso, revisita as remoções à luz das experiências de diferentes mulheres, em uma abordagem interseccional que traz vozes e narrativas como construção epistemológica do conhecimento que procura reconceituar a remoção como um processo mais amplo de despossessões estruturais -e, também, como gerador de espaços coletivos de transformação.
Reflete também sobre as dinâmicas atuais de constituição e desfazimento de territórios populares nas metrópoles, em meio a processos de reestruturação territorial. Traz essa reflexão a partir de três aspectos: das lógicas que justificam as ameaças e remoções, do papel dos diferentes agentes e políticas envolvidos e dos mecanismos estruturais contidos nos processos de despossessão em que o Estado, de forma institucionalizada e em parceria com setor privado, é agente da remoção.
A partir do que chamamos de “observando de perto”, o livro se aproxima dos territórios populares de São Paulo. Passa pelo Centro, com foco nas ocupações de edifícios e novos contornos que a criminalização destas trouxe para o próprio ordenamento social do qual as ocupações são parte; pela Zona Norte, cujos processos de produção do espaço urbano por um mercado imobiliário popular são permeados por atos e transações definidos a partir de normas próprias e, por vezes, violentas; e pela Zona Leste, com a problematização da tendência normativa de despossessão pela propriedade privada e suas estratégias de mobilização.
A interlocução e atuação articulada do Observatório de Remoções com parceiros – dentro e fora das institucionalidades – que atuam pela garantia de direitos dos atingidos e ameaçados de remoção tem permitido produzir novas narrativas sobre os territórios objeto de discriminação e ação violenta. E, também, denunciar processos de remoções e ameaças de remoções, mobilizar as comunidades ameaçadas, fortalecer as redes de resistência e, ainda, fomentar processos insurgentes em que moradores ameaçados protagonizam a elaboração de planos urbanísticos populares, contado pela experiência de Serviluz/Titanzinho em Fortaleza.
Estas reflexões abrem-se para uma agenda de investigações futuras que desenha um novo ciclo de pesquisas, em um trabalho contínuo do Observatório e sua rede de parceiros.
O livro, por fim, sintetiza estas reflexões em um conjunto de 13 artigos, escritos e reescritos à várias mãos, reunidos em quatro blocos que procuram abarcar a complexidade e diversidade de temáticas e abordagens envolvidas nos trabalhos que acontecem no âmbito do Observatório de Remoções.
A publicação está disponível para download aqui. Abaixo, um vídeo-resumo da publicação:
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