Por Raquel Rolnik
À margem da lei, a cidade de São Paulo está prestes a perder uma de suas últimas áreas verdes para a implementação do prolongamento da Marginal Pinheiros, na zona sul. Trata-se dos sete quilômetros de vegetação remanescente da orla dos rios Pinheiros e Jurubatuba que podem ser destruídos para passagem da política carbonocêntrica e rodoviarista da Prefeitura de São Paulo, na contramão das medidas que devem ser adotadas para enfrentarmos a crise climática que nos assola.
Esta área, ainda em 2014, foi decretada Zona Especial de Proteção Ambiental (ZEPAM). Dois anos depois, a função ambiental foi reafirmada através de diretrizes no Plano Regional da Subprefeitura de Santo Amaro, que propôs para ali o estabelecimento da Via Parque Jurubatuba. A proposta foi também reforçada no Projeto de Intervenção Urbana (PIU) Arco Jurubatuba de 2023. Contrariando todas essas decisões, a Prefeitura pretende asfaltar este terreno verde de 130 hectares por meio de uma licitação para implantar a extensão da Marginal do Pinheiros. De acordo com o calendário do município, já no próximo dia 3 de março será divulgada a empresa ou consórcio responsável pela obra que sequer tem um projeto executivo elaborado.
A intervenção é apoiada em um “jabuti” aprovado a jato por manobra da Câmara Municipal de São Paulo, em dezembro do ano passado, e sancionado pelo prefeito Ricardo Nunes (MDB), que converteu a área de Zepam em Zona Eixo de Estruturação da Transformação Metropolitana (ZEM).
Mas o prolongamento da Marginal Pinheiros é um erro multiplicado, no mínimo, por três. O primeiro por reforçar uma visão ultrapassada nas formas de ocupação do espaço urbano em sua relação com a natureza: hoje no mundo todo o debate é sobre como preservar os rios e suas margens, usando soluções baseadas na natureza. Em oposição a esse processo, o projeto da Prefeitura reafirma a impermeabilização, o confinamento dos rios em canais, com consequências desastrosas para a drenagem urbana, vide as enchentes que estamos sofrendo.
O que nos leva ao segundo equívoco: a questão do transporte e da mobilidade na capital paulista. A literatura já consolidou que a abertura de avenidas ou sua ampliação apenas piora o trânsito, sem qualquer melhoria na mobilidade do cidadão que circula de carro, a pé ou sob veículos de duas rodas. O resultado é simples, a lógica rodoviarista atrai ainda mais carros e desconsidera parte importante da solução, que é o transporte coletivo de massa que deveria ser o verdadeiro foco da política de transporte.
E, finalmente, em terceiro lugar, a perda de um parque, que foi garantido através da luta da população local, em uma região que abrange desde a Billings até o canal do Guarapiranga, com potencial de criar uma grande área de lazer. Todo um ônus para promover uma licitação bilionária que custará R$ 1,7 bilhões para a cidade.
Para salvar uma das últimas áreas verdes da capital paulista desse retrocesso, apoie o abaixo-assinado criado por moradores e movimentos sociais em defesa do Parque Jurubatuba. Acesse aqui.
(*) Raquel Rolnik é professora na FAUUSP e coordenadora do LabCidade
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