Brasília – Marcha das Mulheres Negras Contra o Racismo, a Violência e pelo Bem Viver em Brasília, reúne mulheres de todos os estados e regiões do Brasil (Marcello Casal Jr/Agência Brasil)

 

Por Larissa Lacerda

Passados trinta anos desde a chamada redemocratização, qual avaliação pode ser feita sobre a atuação dos movimentos feministas neste período? As pautas ainda são as mesmas daquelas levantadas nos anos 1980?  Quais avanços podem ser identificados nas últimas décadas para a vida das mulheres que habitam as cidades? Ainda podemos/devemos apostar em reivindicações voltadas ao Estado?

O encontro do dia 1º de fevereiro do Seminário “Cidade, Gênero, Interseccionalidades” será dedicado a discussão em torno das mulheres e dos feminismos, buscando lançar luz sobre a diversidade de sujeitos que vivem, circulam e disputam as cidades e a produção do espaço urbano. Ao colocar as mulheres no centro dos processos urbanos, ampliam-se os temas do debate e desnaturaliza-se o sujeito que vive a cidade, experimentando um deslocamento no interior de um campo construído, majoritariamente, a partir de uma perspectiva androcêntrica e branca, tal como nos atentam Poliana Monteira, Mariana Medeiros e Luiza Nasciutti, no artigo “Insurgência feminina: A ética do cuidado e a luta contra a remoção” (2017).

Enquanto corpo teórico e prática política, o feminismo – ou os feminismos – fala a partir de experiências múltiplas e corpos diversos, que dão lugar a uma pluralidade de demandas e movimentos: os feminismos das mulheres negras, das indígenas, das quilombolas, das ribeirinhas, das brancas, o transfeminismo, o putafeminismo e outras tantas nomeações que nos chamam atenção para a diversidade que marca, e desestabiliza, a categoria mulher. E que também repercute nos modos como essas mulheres experienciam a vida urbana.

Neste encontro, daremos maior atenção aos movimentos feministas urbanos, refletindo coletivamente a partir das experiências de mulheres que estão disputando e construindo o direito à cidade a partir de uma perspectiva feminista. Partindo de uma discussão da genealogia dos movimentos feministas no Brasil, desde um panorama histórico até o momento atual, o olhar se volta aos desafios contemporâneos que estão colocados para os movimentos de mulheres que têm o espaço urbano como uma pauta central.

Para iniciar nossa conversa, convidamos mulheres com histórias e engajamentos diferentes nos movimentos feministas: Eva Blay, Claudia Garcez e Gabriela Pereira, com mediação de Paula Santoro.

Eva Blay é uma histórica militante feminista, socióloga, que dedicou boa parte de sua vida ao estudo das condições de vida das mulheres, subsidiou atividades de sindicatos, associações de direitos civis e, sobretudo, entidades feministas. Como presidente do Conselho Estadual da Condição Feminina de São Paulo, no governo Franco Montoro (1983-1987), criou a primeira Delegacia de Defesa da Mulher do país. Como senadora (1991-1995), apresentou projeto de lei propondo a descriminalização do aborto até 12ª semana de gestação, entendendo a interrupção da gravidez como um direito de livre escolha da mulher – proposta que nunca foi apreciada pelo Senado Federal.

Ao seu lado, Claudia Garcez fala a partir de sua experiência no entrelaçamento da luta por moradia digna, como militante do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MSTS), com o fim da violência de gênero, enquanto coordenadora da Ocupação Tereza de Benguela. Em um prédio abandonado da COHAB, na zona leste da capital paulista, mulheres militantes do MTST se reuniram para criar um espaço de acolhimento para mulheres.

Gabriela Pereira, professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da UFBA e pesquisadora no grupo de pesquisa Lugar Comum, incorpora a questão racial às discussões de gênero e do urbano. Em sua tese de doutorado, Gabriela problematiza a cidade e a produção do espaço urbano a partir das narrativas da escritora Carolina Maria de Jesus. Em suas palavras, trata-se de pensar desde “uma narradora imprevista, de um lugar improvável, cujo discurso soa estranho, [que] disputa a narrativa da cidade” (2015). Ao colocar a figura de Carolina Maria de Jesus no centro da produção discursiva sobre a cidade, Gabriela propõe um deslocamento nesse campo que, historicamente, legitima certos sujeitos e saberes, enquanto marginaliza e invisibiliza outros.

Seminário Cidade, Gênero e Interseccionalidades acontecerá em São Paulo entre 28 de janeiro e 1 de fevereiro de 2019, realizado pelo Centro de Pesquisa e Formação do Sesc São PauloVeja o evento no Facebook.

Palestrantes que participarão do seminário no dia 01/02:

Eva Blay

Professora Emérita do departamento de Sociologia da USP. Foi Senadora da República entre dezembro de 1992 e janeiro de 1995. Coordena programa USP Mulheres/ONU. Publicou livros e artigos sobre questões urbanas habitação operária, participação política da mulher, violência contra a mulher, feminismo e masculinidades e imigração judaica.

 

Claudia Garcez

Liderança na luta por moradia do MTST, da Ocupação Teresa de Benguela, Claudia está envolvida com o debate de gênero, saúde e violência contra a mulher, promovendo o debate  dentro do movimento.

 

 

Gabriela Leandro Pereira

Professora da Faculdade de Arquitetura da Universidade Federal da Bahia, coordenadora da linha “Presença Negra na Produção da Cidade” no do Grupo de Pesquisa Lugar Comum e Pesquisadora Associada no PPGAU-FAUFBA. Tem como áreas de interesse urbanismo, culturas urbanas, periferias, culturas populares, gênero, raça, direito à cidade, planejamento urbano e ambiental, história da arquitetura, das cidades e do urbanismo no Brasil, América Latina, e na diáspora africana.

 

Paula Santoro

Arquiteta urbanista, professora da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP, coordena o projeto observaSP junto ao LabCidade, possui Auxílio à Pesquisa FAPESP. Trabalhou no Ministério Público do Estado de São Paulo, no Instituto Pólis e no Instituto Socioambiental – ISA.