Por Raquel Rolnik*
O prefeito Bruno Covas publicou no dia 23 de fevereiro o Decreto 58.639 que altera várias regras do Bilhete Único na cidade de São Paulo: não serão mais válidos os Bilhetes Únicos sem identificação e o limite para utilização do carregamento foi reduzido. Mas a principal mudança é a redução do número de linhas que os cidadãos podem utilizar durante o período com o Bilhete Único.
Até a publicação deste decreto, era possível usar até quatro linhas em duas horas. No caso do Bilhete Integração, isto poderia incluir trens e metrô. A partir deste decreto os usuarios de vale transporte só poderão embarcar em duas linhas de onibus – ao invés de quatro como antes. Quem paga meia tarifa também só pode pegar duas conduções, mas isto já era assim desde o ano passado”
É importante entender essas medidas num âmbito mais amplo de mudanças que estão em andamento desde 2017 – e que, combinadas, vão reduzir drasticamente as possibilidades das pessoas circularem pela cidade, além de agravar os custos de transporte justamente para a parcela da população que mais depende dele e menos tem condições de pagar.
O aumento da tarifa, implementado desde o início deste ano, como já comentamos aqui, foi bem acima da inflação, maior do que o aumento do salário-mínimo e do rendimento médio dos trabalhadores. Este aumento se combina com um corte de linhas que antes tinham início em bairros distantes e tinham como ponto final o centro expandido, destino final de boa parte das viagens. Muitas destas linhas já foram cortadas e integradas com estações de metrô ou corredores de ônibus, numa medida de racionalização do sistema, visando reduzir o número de ônibus em circulação nas vias principais, para aumentar sua velocidade de tráfego. O novo sistema, que acaba de anunciar os concessionários vencedores, inclusive prevê ampliar ainda mais as medidas deste tipo.
Esta mudança, entretanto, implica que as pessoas que moram nos bairros mais distantes, nas periferias, vão precisar fazer mais integrações: por exemplo de uma van para um ônibus em um corredor e depois eventualmente outro ônibus ou van ou metrô. Mas com as mudanças nas regras de uso do Bilhete Único, elas não poderão pegar mais do que duas conduções dentro deste intervalo de três horas, sendo obrigadas a pagar mais uma tarifa. Que, é bom dizer mais uma vez, está mais cara.
Ou seja, o resultado dessas mudanças combinadas é uma verdadeira bomba de exclusão que vai na contramão da ampliação das possibilidades de plena circulação na cidade. É lamentável andar para trás, justamente quando, graças a esforços dos governos estadual e municipal, estávamos assistindo em São Paulo a uma ampliação do acesso à cidade, graças a expansão dos trilhos, corredores exclusivos, integração entre trens, metrô e ônibus e medidas operacionais como o Bilhete Único.
* Professora da FAU-USP e coordenadora do LabCidade. Texto publicado originalmente no UOL.
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