Ocupação Jardim da União, no Grajaú. Foto: Peabiru

Por Irene Maestro Guimarães* e Talita Anzei Gonsales**

A Ocupação Jardim da União (localizada na Av. Antônio Burlini, 1000 – Grajaú/SP) reúne, desde setembro de 2013, 560 famílias que consolidaram sua moradia em um terreno ocioso pertencente à Companhia de Desenvolvimento Habitacional e Urbano (CDHU), vinculada à Secretaria de Habitação do Governo do Estado de São Paulo e responsável pela execução de programas habitacionais estaduais. Os baixos salários ou o desemprego, aliados aos altos ao aumento dos preços dos aluguéis e à necessidade de sobreviver, fez com que essa população de baixa renda tivesse que recorrer à ocupação da terra como forma de exercer seu direito à moradia digna.

A auto-organização dos moradores fez com que hoje o Jardim da União seja um bairro onde existem as mais diversas atividades educacionais e culturais para as crianças e adolescentes que ali vivem, como aulas de capoeira e um time de futebol, dentre outras atividades. A estruturação de uma Associação de Moradores fez com que as famílias participassem não só das demandas referentes à moradia, mas também nas demandas do bairro, como a atuação no Conselho de Saúde e na defesa das escolas da região. Um intenso processo de mobilização coletiva, com mutirões de trabalho para enfrentar os problemas cotidianos da comunidade e processos de decisão tomados em assembleias.

Ao longo dos anos, os moradores fizeram diversas mobilizações junto ao poder público para encontrar uma alternativa para o problema habitacional em questão. Entre 2015 e 2016, o movimento Luta Popular passou a construir o processo de luta, resistência, mobilização e trabalho cotidiano na ocupação em conjunto com os moradores. Finalmente, em junho de 2016 foi estabelecido um acordo judicial entre as partes para que a demanda das famílias fosse incorporada no Programa Minha Casa, Minha Vida Entidades. Contudo, no decorrer do projeto, tornaram-se indisponíveis os recursos públicos para as modalidades do Programa que atendem à chama “faixa 1” por medida do Governo Federal.

Diante desse cenário e do “retorno à estaca zero”, abriu-se uma nova tratativa junto à CDHU para que fosse discutida a possibilidade de Regularização Fundiária Urbana de Interesse Social (anteriormente regulamentada pela MP nº 759/2016, atual Lei nº 13.465, de 11 de julho de 2017), visto que um de seus principais objetivos é justamente “ampliar o acesso à terra urbanizada pela população de baixa renda, de modo a priorizar a permanência dos ocupantes nos próprios núcleos urbanos informais regularizados”.

O Jardim da União configura, efetivamente, um núcleo urbano consolidado, que existe há mais de cinco anos, com a maioria das casas de alvenaria. Mas não só. Os moradores, quando da perspectiva da regularização da área, se organizaram, cotizaram e contrataram uma assessoria técnica (Peabiru) para o desenvolvimento de um projeto de regularização urbanística para a comunidade, que está sendo desenvolvido há quase dois anos, com casas e ruas sendo reordenadas e com processos de recuperação ambiental da área, já que trata-se de uma área de proteção ambiental. Além disso, a Sabesp já aprovou o contrato com as famílias e a previsão de início das obras é janeiro de 2019.

Vista aérea da Ocupação Jardim da União. (Imagem: Google Maps/Peabiru)

A comunidade sempre esteve altamente comprometida com a construção de uma alternativa negociada, pacífica, comprometida e efetiva para o problema habitacional de que são vítimas. E, mesmo com todas as dificuldades que permeiam sua condição social, se organizaram, se mobilizaram e são sujeito (coletivo) ativo da conquista de seus direitos.

O acordo com a CDHU tinha levado, inclusive, ao arquivamento do processo de reintegração de posse. Diante da nova situação de fato, a CDHU se comprometeu em meados de 2018 a estudar e aprovar o processo administrativo de REURB (Regularização Fundiária com Urbanização), instrumento previsto na Lei 14.365 de 2017, e apresentado pela Associação de Moradores. Na última reunião com a CDHU, em setembro de 2018, deu-se o aval para verificar como proceder a regularização fundiária, visto que esse seria o melhor caminho para se resolver o conflito ali instaurado.

Contudo, surpreendentemente, sem qualquer comunicação aos moradores, ou qualquer fato novo aparente, a CDHU solicitou, no dia 18 de outubro de 2018, a reintegração de posse da área. Desde então, o movimento procurou os responsáveis, que vinham tocando a negociação, mas não obtiveram qualquer resposta. Na verdade, a CDHU tem se negado a atender os telefonemas ou a receber os representantes da Ocupação Jardim da União, o que vai no sentido oposto do acordo que vinha sendo construído a partir da perspectiva de regularização fundiária e urbanização. O processo foi desarquivado e aproximadamente 2.200 pessoas correm o risco de serem removidas, sem a apresentação de qualquer alternativa ou diálogo.

Após a realização de uma assembléia de moradores e apoiadores, foi fundado o Comitê de Defesa do Jardim da União, que optou por realizar uma série de atividades para a divulgação do caso e sensibilização sobre a situação. Neste momento, a reivindicação principal dos moradores é o agendamento de reunião para esclarecer essa quebra de acordo e a imediata retomada das negociações.

Abaixo, assista ao vídeo produzido pelo movimento Luta Popular para a campanha contra o despejo da Ocupação Jardim da União:

 

* Irene Maestro Guimarães é militante do movimento Luta Popular
** Talita Anzei Gonsales possui graduação em Engenharia Ambiental e Urbana pela Universidade Federal do ABC é pesquisadora do Observatório de Remoções, integrante do LABJUTA e doutoranda em Planejamento e Gestão do Território também pela Universidade Federal do ABC.